quarta-feira, outubro 04, 2006

A volta dos que não foram

A declaração de voto do governador Lúcio Alcântara (PSDB-CE) em Geraldo Alckmin é emblemática do que vai acontecer neste segundo turno. Ou melhor, já está acontecendo: os tucanos e pefelistas que puxavam o saco de Lula, dando como líquida e certa a vitória em primeiro turno, estão de volta ao ninho.
Alcântara rompeu com o presidente do PSDB, Tasso Jereissati, que preferiu tirar o apoio à sua reeleição e despejar em Cid Gomes, do PSB, aliado de Lula e irmão do ex-ministro Ciro Gomes (um dos deputados mais bem votados do país). O governador ficou uma fera, e quem pagou o pato foi Alckmin. Numa cena de traição explícita, Lúcio Alcântara foi ao Planalto confraternizar com Lula no meio do primeiro turno. Perdeu a eleição para Cid e, agora, mal começou o segundo, já dá meia volta e declara voto em Alckmin. Durma-se com um barulho desses. Ou durma-se com uma política dessas...
A imprensa, sempre acusada de ser 'tucana', passou a campanha mostrando um Alckmin às traças, abandonado pelo PSDB, pelo PFL, pelos candidatos a governador, por gregos e troianos, sem vigor e sem chances. Não se passou um dia sem uma 'crise' na campanha, demonstrando fragilidade. Agora, pelo visto, estão todos de volta.
O PFL, que chegou a anunciar o fim da velha aliança com o PSDB depois da eleição (lia-se: depois da derrota de Alckmin), agora é alckmista desde criancinha e para todo o sempre, amém. E reconhecendo que, sem os tucanos, a vida pode ficar muito dura. O partido perdeu Estados importantes, como a Bahia, está ameaçado em Pernambuco, disputa um surpreendente segundo turno no Maranhão e só levou um governo no primeiro turno: o do DF, com José Roberto Arruda.
Sem poder (e sem cargos) nos Estados, o jeito é apoiar Alckmin e rezar para ele ganhar, para poder se pendurar no governo federal. Caso contrário, só sobra o Senado para os pefelistas reinarem. Ali, ele ficam com uma bancada de 18 senadores, a maior da Casa. E, pela tradição, cabe à maior bancada fazer o presidente.
No PSDB, criou-se uma situação curiosa: foram meses de análises mostrando que Alckmin não estava com nada e enfatizando a força e as projeções de José Serra e Aécio Neves no cenário nacional, já que ambos estiveram na frente das pesquisas do início ao fim e acabaram mesmo se elegendo em primeiro turno em São Paulo e Minas. Esqueceram-se todos de combinar com o adversário --o adversário de Lula. Pois quem emerge forte da eleição, até pela surpresa, é Alckmin.
Se ele ganhar, será que topa acabar com a reeleição? Duvide-o-dó. Depois de uma trajetória solitária no primeiro turno, agora ele não tem por que dar essa colher de chá aos companheiros tucanos. Vai fazer de tudo para ficar 8 anos. E Serra terá 72 anos em 2014.
Mas, assim como os pefelistas, os tucanos também não têm para onde correr. Gostem ou não, vão ter que mergulhar na campanha. É melhor um presidente tucano na mão do que dois voando e, pior, com um petista no Planalto.
A previsão é que Alckmin feche ainda com o PDT de Cristovam Buarque e que produza uma espécie de ressurreição: a dos peemedebistas tucanos. Refiro-me a Michel Temer (que já anunciou apoio ontem), Moreira Franco, Jarbas Vasconcelos, Eliseu Padilha, essa turma. No primeiro turno, só apareceram os peemedebistas lulistas, como Sarney, Renan, Suassuna, Jader. Agora, os outros vão emergir, quer apostar?
Lula tem uma vantagem forte sobre Alckmin: ele precisa de apenas 1,5 ponto a mais para ganhar, enquanto o adversário precisa de cerca de 8. Além de manter fiéis os votos do Norte e do Nordeste, onde teve uma vitória avassaladora, Lula vai ter que pescar em São Paulo, nos Estados do Sul e no Rio, sem permitir uma sangria em Minas. Quanto a Alckmin, precisa fazer o inverso.
A diferença é que os votos paulistas, sulistas e mineiros foram crescendo para o tucano na reta final, mas os votos nordestinos foram sólidos e fiéis a Lula do início ao fim, são uma espécie de muralha. O vento sopra a favor de Alckmin, que virou a 'onda' na reta final do primeiro turno e do início do segundo. Mas quem disser que a eleição está decidida, para um lado ou para outro, está meramente torcendo, manifestando uma vontade, não traduzindo uma realidade. No duro, no duro, a eleição está indefinida. E os times e estratégias, apenas sendo montados.

De Eliane Cantanhêde na Folha

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