terça-feira, setembro 12, 2006

Do Blog de Josias de Souza:



Sobre FHC, ACM e o tempo.

Fernando Henrique Cardoso, personagem já entrado em anos, sabe que não tem muito futuro na política. Mete-se na refrega eleitoral porque imagina que os mais moços, por inexperientes, acreditem que ele também não tem passado. Mas o passado nunca passa. Está aí, sempre presente, imiscuindo-se no presente. Leia-se, a propósito, o teor de uma nota da coluna de Mônica Bergamo (assinantes da Folha):

Paz e Guerra - Dias antes de lançar sua polêmica "carta aberta" ao PSDB, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso conversou longamente com o senador baiano Antônio Carlos Magalhães, do PFL -há tempos os dois fizeram as pazes e hoje se dão "muito bem", diz ACM. "Eu disse a ele que a campanha deveria ser mais agressiva, que precisávamos fazer alguma coisa. Ele me disse que estava mesmo com vontade. Foi um desabafo."

Abra-se aqui um parêntese. Só para lembrar que ACM, em passado recentíssimo, notabilizou-se pela crítica contumaz que fazia ao estilo acomodatício de FHC. Peitou a autoridade presidencial a mais não poder. Até debaixo do teto do Palácio da Alvorada. Como em maio de 1999, num encontro testemunhado por Pimenta da Veiga, Jorge Bornhausen e Marco Maciel.

FHC cobrava coesão de seus aliados no Congresso. "Tudo bem, mas você precisa se ajudar", alfinetou ACM. FHC embatucou-se: "Como assim?". E ACM: "O seu estilo está superado. É preciso mais ação". FHC eriçou-se: "Com esse meu estilo ganhei duas eleições".
ACM não se deu por achado: "O Getúlio ganhou três e terminou dando um tiro no peito". E FHC: "Eu não tenho o seu jeito. Não sou brigão. Nem por isso fujo da responsabilidade. Combati a Oban em São Paulo. Fui encapuzado, interrogado".
Antes que Bornhausen e Maciel providenciassem panos quentes, ACM ainda disse: "Isso não me impressiona, presidente. Nessa época eu dava tapa em general". Referia-se a entrevero que teve, em 1965, com o general João Costa.
ACM era, então, deputado federal pela Arena. O general, que comandava a 6ª Região Militar, em Salvador, acusou-o de espalhar boatos sobre um caso extraconjugal que jurava inverídico. Encontraram-se na sede do governo baiano.

Deu-se num pequeno elevador o ápice do sururu. Sob os olhos esbugalhados de Lomanto Júnior, então governador da Bahia. Enfezado, o general dirigiu-se a ACM com o dedo em riste e a voz no teto. ACM golpeou-lhe o quepe, lançando-o ao chão.

Minutos depois, isolados numa sala do Palácio da Aclamação, ACM contou ao desafeto que ouvira sobre sua suposta amante dos lábios de outro general: Ernesto Geisel, então chefe do Gabinete Militar de Castelo Branco. Fecha parêntese.

Entre o FHC agressivo do manifesto e o presidente que dizia a ACM que não tinha “o seu jeito” há um novo personagem. É um FHC que, cioso da própria obra, não se conforma com a vergonha que seu partido tem de defender o seu governo. Sabe que o tempo é implacável. Seu relógio não tem mais ponteiros. Tem duas espadas. E não quer fazer feio no verbete da enciclopédia.